BENDITAS TRADIÇÕES DE A.A.: SÓBRIO MODO DE CONVIVÊNCIA!

“Benditas Tradições de A.A.: sóbrio modo de convivência!”
Algumas vezes, quando as coisas parecem não estar indo muito bem no grupo, nos organismos de serviços ou até mesmo em nossa Irmandade como um todo, ficamos tentados a utilizar a força das nossas personalidades para resolvermos os problemas. Achamos que, se não fizermos nada, tudo vai se perder ou acabar. Quando isto acontece, normalmente, embutido neste pensamento está o medo. Entendemos este sentimento até certo ponto, pois o instinto de preservação é um dos mais aguçados nos seres humanos e nós, alcoólicos, que quase sucumbimos por causa da doença do alcoolismo, sabemos que nossas vidas só foram alcançadas graças à unidade de A.A. Dependemos diretamente dela. “Torna-se claro que o Grupo tem de sobreviver para que o indivíduo não pereça”. Por isso, ao menor sinal de turbulência, quase que instintivamente, tendemos a lançar mão das Doze Tradições como se fossem armas, transformando-as em regras que todos, obrigatoriamente, deveriam seguir rigidamente. Costumamos ter a impressão de que, se não fizermos isto, vamos perder o controle, e que tudo estará perdido.
Felizmente, apesar de agirmos assim em algumas situações, ao final tem prevalecido o entendimento de que nossas Tradições devem ser praticadas e guiadas pelos sentimentos da confiança e da fé. Caso contrário, nossa personalidade alcoólica, naturalmente, resistente a receber ordens, impediria que nos agrupássemos em torno do nosso único propósito e individualmente, como já dissemos, não sobreviveríamos. Ao trocarmos regras por sugestões, imposição de leis por liberdade, medo por confiança, garantimos a preservação das nossas vidas e daqueles que ainda estão por chegar.
A garantia de que devemos continuar praticando-as dessa forma, ou seja, com todo nosso amor e tolerância, reside na nossa própria história. “Nos primeiros anos de existência (1935 a 1946), A.A. viu-se às voltas com inúmeros problemas e dificuldades decorrentes de sua própria expansão, primeiro dentro dos Estados Unidos e Canadá, depois também em outros países e continentes. Problemas ligados à formação dos seus grupos sob circunstâncias as mais inusitadas, à sua sustentação financeira e coesão interna, aos requisitos para tornar-se membro e às relações intergrupos e com a comunidade/sociedade, os quais chegavam ao conhecimento dos co-fundadores principalmente através de cartas enviadas por indivíduos e grupos recém-formados. As respostas sempre personalizadas a essa volumosa correspondência, analisadas e discutidas por um grupo pequeno, coeso e pragmático de pessoas, cujo fluxo durou cerca de dez anos, associadas também ao conhecimento mais técnico de alguns pioneiros profissionalmente ligados ao mundo das organizações comerciais, formaram a base principal para a formulação das Tradições, que em 1946 foram sistematizadas e publicadas pela primeira vez, enunciando as soluções genéricas encontradas e doravante sugeridas a todos os grupos, para fazer frente àquelas dificuldades”.
As Doze Tradições foram forjadas através das nossas experiências. E criaram um modo de convivência singular (especial, individual, particular, estranho, excêntrico, incrível), singularmente forjado, que afetou profundamente o modo de convivência de seus membros. Tivemos a completa liberdade para errar e acertar. Em momentos que corríamos o risco de nos perder, necessariamente, um Deus amantíssimo, respeitando nossa liberdade, em última análise agia para nos guardar. A graça da sobriedade liberada por Deus, sem nenhuma obrigação e sem que nada fosse exigido em troca, retirou de qualquer um de nós, membros desta Irmandade, a autoridade para impor aos seus iguais qualquer coisa que seja. Permitindo que tenhamos por meio da pratica das “benditas Tradições de A.A.: um sóbrio modo de convivência”.
Não somos dirigidos por mandamentos. Viver pelas Tradições como se elas fossem regras seria o mesmo que rejeitar aqueles que, num primeiro momento, não teriam a menor condição de entendê-las, quanto mais praticá-las. Se as utilizássemos como Leis, elas serviriam mais como sentença de condenação do que de salvação. Os alcoólicos, mesmo antes de chegar, estariam condenados à morte. A prática das Tradições por parte daqueles que já estão em recuperação não é uma questão de obrigação e nem se trata de uma coisa boa ou ruim. Nós lhes obedecemos porque inicialmente precisamos, e depois porque gostamos do tipo de vida que tal obediência proporciona. Quando as praticamos por amor, respeitamos o desejo do próprio Poder Superior que nos acolheu e nos acolhe, mediante o livre exercício da nossa vontade. Deus não deseja que acreditemos Nele porque somos forçados. Ninguém ama por decreto. Somos atraídos para Ele por causa de sua bondade e misericórdia. Com sua imensurável grandeza, faz-se anônimo para realizar os milagres no nosso meio e às vezes se faz tão pequeno que nem notamos sua presença. É incrível como Ele parece gostar de estar em nossa companhia.
O mundo tem passado por muitas mudanças e grandes avanços no campo da medicina; mas, quanto à doença do alcoolismo, ainda não se descobriu a cura. Os seus males continuam atingindo os alcoólicos de hoje da mesma forma que os de ontem. Em alguns casos, os sintomas atuais são ainda piores (dependência cruzada). Se nós, seres perecíveis, não mudamos, quanto mais Deus. Por isto, se até agora o Poder Superior permitiu que o A.A. funcionasse durante todos estes anos, acredito que, amorosamente, dar-nos-á a liberdade para, como personagens vivas, continuarmos a escrever esta história até o dia em que Ele precisar de nós. Entendo que, se nos mantivermos firmes no nosso propósito primordial, por dois motivos seria inimaginável calcular o tempo de existência da nossa Irmandade. O primeiro é o incomensurável amor de Deus. O segundo está ligado ao aumento da população mundial. A medicina, através de pesquisas feitas por organismos oficiais de saúde, comprova que de 10 a 15% desta população é portadora desta enfermidade. Assim sendo, proporcionalmente, nossa demanda aumenta e não diminui. Enquanto existir um alcoólico em nosso planeta, nossa missão continuará.
Acreditamos que, como antídoto para os nossos maiores temores, devemos nos esforçar para fazermos o melhor que pudermos na prática dos três legados: Recuperação (Doze Passos), Unidade (Doze Tradições) e Serviço (Doze Conceitos). Silenciando nossos anseios pessoais, trocando as dores do alcoolismo pelo amor da recuperação e cuidando em sermos zelosos na renovação do nosso caráter, por meio das sugestões do programa. Com estas tentativas, acredito que estaremos fazendo a parte que nos cabe nesse todo que é o A.A. Podemos nos acalmar e confiar, porque o Poder Superior sempre tem feito a parte Dele.
A Irmandade de Alcoólicos Anônimos, através de suas Tradições, constitui-se para muitos num estranho espetáculo. Como bêbados irresponsáveis podem chegar ao ponto de conviverem harmoniosamente entre eles e com a sociedade que os rodeia? Por meio da admissão de suas fraquezas, conseguem transformar defeitos em dons. Mas, na verdade, quando nossa sociedade assume esta postura, paradoxalmente, ela se torna a nossa grande fonte de força que misteriosamente nos mantém unidos. Nossas Tradições, na realidade, são uma fratura exposta de nossas falhas; é o reconhecimento de que temos muitos defeitos. Esta atitude eleva-nos o entendimento sobre a necessidade de seguirmos as orientações dos nossos princípios tradicionais, sem o qual pereceríamos por falta de unidade.
Outro aspecto é que individualmente elas atuam no mesmo sentido, apontam claramente para nossas imperfeições. Quando percebemos nossos próprios erros, criamos a condição favorável para repará-los. Além disso, outra conseqüência desta prática é que, ao notarmos nossas falhas, tornamo-nos mais amenos e tolerantes com os outros, deixando de ser tão exigentes. Muitas vezes conseguimos silenciar nosso teimoso ego e deixar de lado nosso orgulho, evitando ressentimentos. Atentamos também para o fato de que, coletivamente, as Tradições só vão funcionar em toda a sua essência se individualmente eu me decidir a praticá-las. Não é mais uma questão de como os outros devem proceder, mas sim de como eu posso ajudar e ser útil. “As Doze Tradições de Alcoólicos Anônimos simbolizam a característica de sacrifício de nossas vidas em comum e elas constituem a maior força de unidade que conhecemos”.
Nosso Segundo Legado é a UNIDADE, representada pela pratica das Doze Tradições, sem a qual, provavelmente, a maioria de nós não existiria. Um dos significados da palavra “legado” é herança. Com isto, concluímos que herdamos das mãos de Deus este tesouro valioso. Herdamos também o privilégio de sermos agentes na transmissão desta mensagem de salvação para os alcoólicos que ainda sofrem. Pela unidade, somos guardados de um problema insolúvel. Recebemos como dádiva o milagre de manter sob controle uma doença incurável.
A maior prova de gratidão que podemos expressar é quando escondemos nossas personalidades atrás dos princípios e reconhecemos que somos apenas agentes de Deus, agentes de milagres. Não somos agentes secretos, mas fomos chamados, escolhidos para sermos seus agentes anônimos.
Poucos têm o privilégio de serem milagres ambulantes. Viver esta experiência é algo fantástico e, ainda por cima, temos um plano de vida que nos possibilita experimentarmos “liberdade, felicidade, não lamentar o passado, nem recusar a enxergá-lo; compreender o significado da palavra serenidade e conhecer a paz; ajudar outras pessoas, sentimento de inutilidade e de autopiedade desaparecidos, perder o interesse por coisas egoístas e nos interessarmos pelos nossos semelhantes; o egoísmo deixando de existir, nosso entendimento e atitudes perante a vida modificados; o medo das pessoas e da insegurança econômica nos abandonando, intuitivamente resolveremos situações que costumavam nos desconsertar”, ver estas promessas sendo cumpridas em nossas vidas não tem preço. “Percebemos, de repente, que Deus está fazendo por nós o que não conseguimos fazer sozinhos”.
Despertados pelas dádivas da dor e do amor, nossos braços se recusarão a ficar cruzados. Lançar-nos-emos sobre a pratica das Tradições com a maior humildade e agradecimento de que podemos dispor. “Quando cheio de gratidão, o coração por certo só pode dar amor, a mais bela emoção que jamais poderemos sentir”.
Por gratidão, desejaremos: 1º – Sacrificar nosso orgulho, medo, raiva, anseio pessoal em benefício do bem estar comum; atuaremos sempre no sentido de preservar a unidade, nosso bem mais precioso (Primeira Tradição); 2º – Aceitar a consciência do grupo como única autoridade final em nossos assuntos, ser apenas servidor de confiança, nunca um governador (Segunda Tradição); 3º – Não seremos nada exclusivistas; eliminaremos tudo que possa impedir a chegada de mais um, não importando o que ele tenha feito ou o que ainda venha a fazer (Terceira Tradição); 4º – Respeitaremos a liberdade dos grupos para conduzir seus próprios assuntos (Quarta Tradição); 5º – Concentrar-nos-emos apenas naquilo para que fomos chamados, no nosso único propósito, transmitir a mensagem ao alcoólico que ainda sofre (Quinta Tradição); 6º – Como consequência lógica da tradição anterior, evitaremos filiarmo-nos a qualquer sociedade ou empreendimento alheios à nossa Irmandade, para que problemas de dinheiro, propriedade e prestígio não nos afastem de nosso objetivo primordial (Sexta Tradição); 7º – Recusaremos receber qualquer doação de fora, assumiremos a responsabilidade pelo pagamento de nossas legítimas despesas, voluntariamente depositaremos nossas contribuições na sacola, único lugar em A.A. onde o material se mistura com o espiritual (Sétima Tradição); 8º – Damos de graça o que de graça recebemos, nenhum serviço será realizado profissionalmente, poderemos até contratar funcionários para prestar serviços especializados, mas como membros serviremos sempre voluntariamente (Oitava Tradição); 9º – Não nos organizaremos a ponto de criarmos governos que possam impor disciplina, normas e regulamentos; a ninguém delegaremos poderes para punir ou expulsar possíveis infratores, entretanto poderemos criar juntas ou comitês de serviços com o objetivo de colocar a sobriedade ao alcance de todos que a queiram (Nona Tradição); 10º – Não entraremos em controvérsias públicas, sabemos que nossa Irmandade perecerá se assim o fizermos, nossa sobrevivência é mais importante do que qualquer outra causa, a recuperação do alcoolismo é para nós a própria vida (Décima Tradição); 11º – Nossas relações com o público terá como base a atração em vez da promoção, preservaremos nosso anonimato pessoal na imprensa, rádio, filmes e televisão, neste sentido nosso anonimato será cem por cento, deixaremos que os nossos amigos falem por nós, queremos a melhor publicidade possível para nossos princípios e à sua obra, mas não de nossos membros individualmente, para nós o importante será sempre a mensagem não o mensageiro (Décima Primeira Tradição); e 12º – Movidos pelo espírito do anonimato, como membros de A.A., deixaremos de lado nossos desejos naturais de distinção pessoal tanto entre nossos companheiros como entre o público em geral, ao sacrificarmos nossos anseios humildemente “tomamos parte na confecção de um manto protetor que cobre toda a nossa Irmandade e sob o qual nós podemos crescer e trabalhar em unidade”, nosso alicerce espiritual (Décima Segunda Tradição).
Anteriormente falamos das promessas, contidas no “Livro Azul”, que estão relacionadas à prática dos Doze Passos sugeridos como um programa de recuperação. Agora, gostaria de apontar uma que é alcançada com a prática das Tradições e que nos foi revelada no “Livro Alcoólicos Anônimos Atinge a Maioridade”: “Temos a grande garantia de que coisas melhores ainda virão”.
Estar em recuperação nesta Irmandade é realmente um privilégio. Minha gratidão deveria ser sem limites. Por mais que eu tente retribuir um pouco do muito que tenho recebido, ainda fica mais difícil. Quando me disponho a prestar algum serviço para a obra, sou o primeiro a ser beneficiado. Existe um princípio espiritual que diz: “é dando que se recebe”, os que o exercem em A.A. tem experimentado sua veracidade. Hoje entendo o que Bill quis dizer com a frase, “A gratidão deveria ir para frente, nunca para trás”. Não evitamos o primeiro gole no ontem nem no amanhã, ele ainda não chegou, nossa sobriedade é construída no hoje, nas presentes 24 horas. Da mesma forma, entendemos que a maior prova de gratidão a ser oferecida está na nossa disposição diária de servirmos em qualquer atividade de A.A., não importando qual. Em Alcoólicos Anônimos não existe tarefa ou encargo mais importante do que o outro. Todos, sem exceção, sendo executados com amor e gratidão, cooperam para que vidas sejam salvas.

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